Os fatos do caso "Médico se recusa a atender sobreaviso"
Em um domingo, após o almoço, em um Pronto Socorro Municipal, chega um paciente vindo do interior do Estado com uma espinha de peixe na garganta. Foi atendido pelo Médico de plantão e encaminhado para o Endoscopista de Sobreaviso, momento em que entraram em contato com este.
Passado algum tempo, e percebendo a ausência do Médico Endoscopista, o funcionário do PSM tenta entrar novamente em contato com o Médico, sem resultado. É então que o Diretor Clínico conhece do fato e imediatamente aciona o Médico de Sobreaviso.
Ao telefone, este profissional da saúde afirma, com todas as letras, que “não iria sair de casa pois era domingo e que era pra ele (o diretor clínico) dar alta para o paciente, para, amanhã, ele se consultar”.
“O Direito não socorre a quem dorme”
Hoje quero falar sobre prescrição em casos de erro médico. Qual seria o prazo? 5 anos? 3 anos?
Ocorre que em 2002, quando aprovado o Novo Código Civil brasileiro, houve uma redução, até prevista, do prazo prescricional das ações de reparação de danos. O artigo em questão é o 206, §3º, inciso V.
Esta norma estabelece que o prazo prescricional para o exercício de pretensão de reparação civil de dano é de 3 anos, no entanto, a melhor interpretação é de que esta norma seja subsidiária, ou seja, somente aplicável quando não houver regra especial determinando outro prazo de prescrição para o exercício da pretensão reparatória.
Acontece que já discutimos sobre a qualificação de prestação de serviço na relação médico – paciente, assim fica claro a utilização de regra especial para esta relação jurídica: o Código de Defesa do Consumidor.
Por tanto, nada mais justo que utilizarmos a regra especial para tratarmos de prazos na relação médico-paciente.
Deste modo, temos o dever, no que se refere à erro médico, aplicarmos o art. 27 do CDC que afirma: “prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria”.
É interessante a ressalva que o legislador faz ao mencionar o início do prazo prescricional o momento do “conhecimento do dano e de sua autoria”, pois em um procedimento médico podemos ter as seqüelas muito após o procedimento. Vale essa ressalva.
Todavia, se o médico estiver atendendo de forma gratuita, a relação médico-paciente não será regulada pelo CDC, pois não há relação de consumo, mas sim será regulada pelo Código Civil de 2002, onde se tem como prazo prescricional de 3 anos.
Sobre a prescrição para ações por erro médico em hospitais públicos será usado o prazo de 5 anos. Não se engane pensando que se pode utilizar o CDC, pois não pode. Não há relação de consumo em serviços prestados pelo Estado. Acontece que o Decreto nº 20.910/1932, em seu art. 1º afirma que: “(...) todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem”.
Suposto erro médico.
Por que sempre divulgam assim as notícias envolvendo um paciente e um médico? Sei que a pergunta é ingênua, sei que é disso que a mídia vive: de vender informações. E um “suposto” erro médico vende muito, ainda mais envolvendo uma criança.
No dia 03 de maio saiu em todo o Brasil o mais novo suposto caso de erro médico envolvendo uma criança. Já não basta o excesso com o caso dos Nardoni, agora querem a qualquer custo outro caso envolvendo uma criança.
O que me choca mais é que a notícia é passada apenas do ponto de vista da “suposta” vítima. Será realmente que aconteceu um erro médico? É uma acusação grave que pode gerar, inclusive, uma Ação por Danos Morais por parte do médico envolvido contra essa família, se não for comprovado nada. Ou seja, se for comprovado um mal resultado.
Pela reportagem percebo que a família ignorou a queda da garotinha e que apenas no dia seguinte foram ao pronto socorro da cidade, onde constataram que não poderiam ser atendidos. Foram outro dia a um hospital em Goiânia onde recebeu atendimento médico.
Entendo que esse procedimento pode concorrer para o estado atual da pequena Mariana. Não estou dizendo que os pais foram relapsos, irresponsáveis. Apenas estou dizendo que por não conhecerem a Medicina à fundo acharam que uma queda simples não traria mal algum.
Para quem quiser ler na integra a notícia do mais novo caso de “erro médico”, acesse o link.
Motivo e motivação, dois instrumentos diferentes.
Motivo é o que antecede um ato, ou seja, a propositura de uma ação. Assim, o motivo, regra geral, deve ser uma lesão ao paciente.
Tive conhecimento de uma ação de indenização movida contra um médico muito próximo a mim, e o motivo seria a imposição de dor a uma criança pelo procedimento reiterado de uma drenagem em um ferimento localizado no pé. Esse amigo me informou que é comum essa freqüência na drenagem de um ferimento, ainda mais quando o paciente (a criança) não pratica todos os procedimentos adequados para uma melhora rápida.
Fui informado, ainda, que a criança foi a outro hospital com o pé inchado e cheio de terra (conduta inexorável à piora do quadro geral) e, que por esse motivo, foi submetida a outra drenagem.
Sendo assim, o pai da criança viu ali um ato, no mínimo, irresponsável (segundo ele) por parte do médico que primeiro atendeu o seu filho.
É até possível percebermos o motivo para uma demanda judicial, no entanto não consigo alcançar a motivação da ação.
A motivação faz parte do ato de demandar. Ela é fruto de uma racionalização do motivo, que faz com que tomemos iniciativas capazes de alterar, constituir ou manter um determinado fato gerador de direito.
Assim, o motivo de ver seu filho sentir dor por uma suposta drenagem mal feita não tem o condão de gerar uma motivação, pois, como foi dito a cima, é freqüente ter que repetir uma drenagem em um ferimento, o que não configura um erro médico. Pelo contrário, mostra a utilização correta da doutrina.
Temos então, no máximo, um mal resultado proveniente da falta de zelo do paciente e de seu responsável.
Vale ressaltar ainda que a jurisprudência é dominante no sentido de que meros aborrecimentos não geram nenhum tipo de dano moral. Assim, a motivação para essa demanda acima mencionada encontra-se viciada ou até inexistente.
Erro Estrutural, você sabe o que é?
Ele afirma que “os hospitais por serem campo de atuação dos médicos e outros profissionais de saúde, quando no atendimento a pacientes internados ou ambulatoriais (...) são, por vezes, palco de atos causadores de danos a determinados pacientes”.
Os erros estruturais são conseqüências dessa falta de infra-estrutura hospitalar o que gera uma enorme improvisação por partes dos médicos que atuam como verdadeiros mágicos ao atendimento do paciente.
Assim sendo, a jurisprudência ainda é afetada por essa controversa acerca da responsabilidade do Hospital por atos cometidos por terceiros.
Em alguns casos não afastando a responsabilidade do hospital.
EMENTA: Responsabilidade civil. Atendimento hospitalar.1. Quando o paciente procura o hospital para tratamento, principalmente naqueles casos de emergência, e recebe atendimento do médico que se encontra em serviço no local, a responsabilidade em razão das conseqüências danosas da terapia pertence ao hospital. Em tal situação, pouco releva a circunstância de ser o médico empregado do hospital, porquanto ele se encontrava vinculado ao serviço de emergência oferecido. Se o profissional estava de serviço no plantão, tanto que cuidou do paciente, o mínimo que se pode admitir é que estava credenciado para assim proceder. O fato de não ser assalariado nesse cenário não repercute na identificação da responsabilidade do hospital.2. Recurso especial conhecido e provido.REsp 400843 / RS - RECURSO ESPECIAL 2001/0196593-7 - DJ 18.04.2005 p. 304 (Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO)
Em outros, afastam a responsabilidade nos casos em que o médico apenas utiliza a estrutura do hospital para atender seus pacientes.
EMENTA: Responsabilidade civil. Erro médico. Esquecimento de corpo estranho no organismo da paciente em cesárea. Responsabilidade do Hospital. Cerceamento de defesa.1. Já decidiu a Corte que o Juiz pode e deve apreciar a necessidade da produção de prova. Todavia, configura cerceamento de defesa se o hospital é impedido de provar, na cobertura do art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor, a culpa exclusiva de terceiro, no caso, a médica responsável pela cirurgia, que com ele não mantém relação de emprego.2. Recurso especial conhecido e provido. REsp 419026 / DF RECURSO ESPECIAL2002/0027101-3 - DJ 21.02.2005 p. 169 RDR vol. 31 p. 410RSTJ vol. 201 p. 297 – (Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO)
Práticas Médicas - um programa com a assinatura do CFM
Neste ponto do perfil, encontramos os médicos com mais de 15 anos de experiência como sendo mais propensos a cometerem um ato danoso, como o próprio entrevistado falou: “o médico experiente tira o sinto de segurança”. E com base simplesmente na sua experiência atende o paciente, esquecendo de tomar os cuidados que tomara antes.
Um vídeo excelente de se ver.
Quem é culpado?
Alguns dias atrás eu vi algo que realmente me deixou preocupado. Uma enquete na comunidade Erro Médico.
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=483164
Lá, propuseram a seguinte pergunta: Os conselhos regionais devem se responsabilizar pelos erros médicos? E acreditem, entre todas as opções, a vencedora foi “sim, solidariamente por ambas as razões a cima”.
Agora, a melhor parte, as razões acima: “Entendo que o Conselho também é responsável pelos atos praticados por seus inscritos ativos e pela fiscalização do exercício da medicina na área de sua competência, com base no disposto no Código Civil”.
Imaginem essa aberração jurídica. Sinceramente não consigo visualizar essa atitude: de responsabilizar os órgãos paraestatais. Todo o conhecimento doutrinário construído até hoje sobre responsabilidade civil, tanto na esfera da disciplina Direito Civil, quanto na esfera Direito do Consumidor foram agredidos.
O que me anima é que as pessoas que votaram nessa enquête na opção vencedora são pessoas ignorantes no sentindo de não terem conhecimento sobre a Ciência do Direito. É inconcebível essa idéia de responsabilizar os conselhos de classe por erros cometidos por um profissional.
Alguém já viu uma pessoa jurídica cometer um erro? Acredito que não. O erro é intrinsecamente ligado ao ser humano, assim só uma pessoa física pode ter o privilégio de errar e responder por seu erro.
Fica aqui meu repúdio contra essas pessoas que movidas por sentimentos passionais esquecem de usar o que nos diferencia dos outros seres vivos: a razão. Por favor, o Direito é apenas uma questão de bom senso, foi a primeira coisa que aprendi na faculdade, e a primeira coisa que vi na prática.
"Médico de atriz global é acusado de erro médico em caso de dengue".
Essa poderia ser uma manchete dos jornais desse fim de semana, mas adivinhe: não é! Hoje vemos pessoas em uma jornada subumana em busca de atendimento médico, morrendo nas portas dos hospitais públicos do Rio de Janeiro, quase que implorando por um mínimo de atendimento.
O governo federal, como forma de alívio para esse caos, trouxe em caráter de emergência algumas dezenas de médicos de outros estados que nem experiência possui no tratamento à dengue.
Então pergunto, pode um cidadão do Rio de Janeiro, com essa demora no diagnóstico da doença, na eterna fila de espera, indo de hospital em hospital, quase que implorando para ser atendido, questionar essa atitude do Estado do Rio?
Sinceramente eu acredito que tenha fundamento essa demanda. Agora imagine o caos que seria no judiciário estadual essa enxurrada de ações. Um verdadeiro desastre.
Perceba, então, que um dos fatores para o aparecimento desta explosão de litigiosidade é político. No momento em que os legisladores, na criação da Constituição de 1988, massificam o acesso à saúde, dando a todos os direitos ao acesso e impondo ao Estado o dever de prestar este serviço, eles o fazem por uma aspiração social de ter sua dignidade, de ver seu direito como ser humano atendido no que tange a sua saúde.
É notável, no entanto, que o Estado universaliza o acesso, mas não cria mecanismos eficazes para a completa prestação de serviço, pois, por diversos motivos se exime da obrigação, deixando a cargo da iniciativa privada a superação das dificuldades.
E o que encontramos hoje? Um sistema de Saúde Pública falido e com uma demanda tal que os hospitais da rede pública não conseguem, sequer, absorver para um atendimento inicial.
Imperícia médica, alguém já viu alguma?
Talvez do ponto jurídico tenha certa razão o argumento acima citado, no entanto, do ponto de vista ético parece que o argumento despreza a distinção importante entre a pessoa diplomada e a pessoa qualificada.
Mesmo se aceitássemos o argumento de não haver imperícia por parte de um médico recém-diplomado, por exemplo, não há nenhuma garantia que cinco anos depois de formado, após a escola da vida, seu preparo prático e conhecimentos técnicos tenham se aprimorado e acompanhado os avanços de sua profissão.
Como, também, o caso de outro médico, recém-diplomado, que não tenha seguido o caminho da medicina e após cinco anos tenha a vontade de exercer sua profissão, este também poderá não ter qualificação, mesmo sendo diplomado.
Assim se faz controversa esta discussão entre uma pessoa diplomada e outra qualificada.
É sério, existe apenas um erro médico!
Isso mesmo, existe apenas um gênero de erro médico, o culposo. Alguns estudiosos do tema também chamam esse ato como erro operacional, por ter ligação íntima com o procedimento médico.
Esse ato é caracterizado pela negligência, imprudência ou imperícia do ato médico ou de uma equipe médica, podendo aparecer separados ou em conjunto, mas, mesmo assim, ainda é apenas um erro médico.
Primeiramente vamos falar da imprudência, pois muitas das situações que acarretam danos aos pacientes são frutos da falta de zelo do médico. Assim, um erro provocado por imprudência é característica do médico que age “sem a devida cautela, expondo o paciente a riscos desnecessários e expondo-se mesmo a riscos de ordem jurídica”.
É muito comum confundir a imprudência com a negligência, no entanto Leonard Martin explica que, normalmente, a imprudência é caracterizada por algo que se faz, enquanto a negligência é caracterizada por algo que se deixa de fazer.
Por tanto, os casos de negligência geralmente são provocados por mera preguiça ou desinteresse dos médicos, no entanto, podem, também, ser fruto do cansaço e da sobrecarga de trabalho impostas a muitos médicos em hospitais e postos de saúde.
Já com a imperícia o CEM se preocupa em duas frentes: a primeira tem a ver com a situação que o médico dá cobertura ou incentiva a prática por pessoas não habilitadas para exercerem a medicina; e a segunda situação, a mais complexa, trata da imperícia do próprio médico.
Assim, temos que ter em mente que essas condutas expostas não configuram crime, pois crime é aquele ato ilícito, culpável e tipificado em lei posterior ao ato, o que não ocorre no nosso sistema de normas, porque o erro médico não é um ato tipificado (ainda).
Então, quando perguntarem quantos erros médicos existem, você já sabe a resposta: Apenas um, o culposo. O que passar disso é crime doloso e o que não chegar a isso é um mal resultado.
Medicina Defensiva, e você com isso?
Esta é a pergunta que a sociedade médica deve fazer ao adotar esta nova medida que se consolida neste novo século. Entretanto, é também uma pergunta que a sociedade (pacientes) deve fazer ao levar ao judiciário todos os tipos de conflitos de interesses entre ela e os médicos. Problemas que podiam ser resolvidos com uma conversa, com o simples conhecimento do paciente e seus familiares da doença e de seus resultados.
Esta polêmica tese surgida para “defender” os médicos da sociedade, sugere que o médico veja em todo o paciente um potencial demandante judicial que pode processá-lo a qualquer momento.
Para evitar problemas, o médico deve usar todos os meios ao seu alcance, inclusive pedir exames desnecessários que possam salvaguardá-lo. Por outro lado, em um debate realizado no site do Cremesp, afirmou o mediador que “o alto número de reclamações de pacientes contra médicos em várias instâncias como o Cremesp e a Justiça indicam que a medicina vai mal” (MARTINS, s/d).
Neste contexto vem a pergunta: a medicina defensiva é uma solução ou mais um problema entre o médico e seu paciente?
O que sabemos, realmente, é que a medicina defensiva é um fato, ou seja, uma conseqüência dessa explosão de litigiosidade que encontramos nos dias de hoje, pois, “a prática da medicina defensiva permite ao médico exercer uma medicina de baixo risco para o profissional da saúde e de alto custo para o paciente, por medo do médico de ser denunciado por má-prática”.
Este cenário é melhor entendido pela pesquisa realizada por David Studdet, da Escola de Saúde Pública de Harvard, em Boston (Massachusetts), que, em maio de 2003, entrevistou centenas de médicos e descobriu que quase 93% deles aderiram às práticas de medicina defensiva. O estudo completa:
[...] Essas práticas incluem a realização de exames médicos desnecessários ou a receita de muitos remédios sem verdadeiro valor para o tratamento dos pacientes, com o objetivo de se proteger de possíveis processos judiciais.
Assim, os custos mais altos da medicina defensiva são partes do custo social de instabilidade no sistema de negligência profissional, acrescentou o artigo.
[...] a forma mais freqüente de medicina defensiva, que é a indicação de caros exames de imagem, parece simplesmente um esbanjamento, mas outras condutas defensivas podem reduzir o acesso ao cuidado médico e podem até apresentar riscos de dano físico, segundo o estudo.
Devido ao fato de a obstetrícia e a detecção do câncer de mama serem áreas muito expostas aos processos legais, a saúde das mulheres pode ser afetada (UOL NOTÍCIAS, 31/05/2005).
Em um outro estudo realizado também nos Estados Unidos, dirigido por Daniel Kessler, da Escola de Administração de Empresas da Universidade Stanford, descobriu que nos Estados onde houve uma reforma das leis que punem a negligência profissional aconteceu um aumento global nas prescrições médicas, e foi além:
[...] Para esse estudo, os pesquisadores usaram os dados da Associação Médica Americano sobre o número anual de médicos na ativa em cada estado de 1985 a 2001 e compararam essa informação com dados sobre as leis estatais de negligência profissional.
A adoção de reformas das leis sobre negligência profissional que reduziu o montante das indenizações (com limites aos pagamentos) levou a um maior aumento nas prescrições médicas (UOL NOTÍCIAS, 31/05/2005).
De acordo com as pesquisas citadas, encontramos a medicina defensiva como uma nova postura do médico para responder ao desafio de negociar, reconhecendo os direitos do paciente e cobrando os direitos dos médicos.
Deste modo, o Manual de Medicina Defensiva sugere que “o médico solicite uma série de exames subsidiários, que possam evitar que ele seja legalmente acionado, para se proteger” (MARTINS, s/d).
Informação Continuada – Parte II (Medicina Documentada)
Achei interessante a relação íntima que ele faz com o dever de informar e sua característica probatória. O autor conclui dizendo que a informação reflete tudo o que acontece ao paciente e que, de alguma forma, está relacionado com o médico. Isto é importante para evitar possíveis negligências de ação ou omissão.
Com base nisso, ele continua, dizendo que o histórico do paciente tem que ser completo e permanente no atual estágio em que a medicina se encontra (medicina moderna), pois esta instrumentalização seqüencial dos procedimentos médicos na vida do paciente é de extrema importância para julgar um caso de responsabilidade médica, visto que através deste documento podemos mostrar claramente se há ou não a relação de causalidade entre o dano e o fato gerador do dano (nexo causal).
Isso me fez pensar se a obrigatoriedade desta informação continuada não é o início da Medicina Defensiva, onde o médico vê o paciente como prováveis autores de ações contra erro médico, e, por conta disso, documenta tudo o que acontece, desde a falta de cuidado do paciente na hora de recusar em tomar um remédio, até mesmo informar no histórico do paciente que ele foi o responsável por determinados procedimentos.
No entanto, um argumento controverso é de que um histórico incompleto constitui uma presunção contra o ato do médico, em outras palavras, ele afirma que em caso de dano a um paciente o histórico deste incompleto é quase uma prova incontestável da culpa do médico. Sinceramente, eu discordo.
É fácil, dentro até do mundo hipotético, verificar casos em que o histórico esteja completo e, mesmo assim, haver erro médico, como o contrário é verdadeiro.
Entretanto, os médicos não devem seguir a idéia de escrever menos é errar menos, pois como vimos um histórico completo e permanente pode ser a prova incontestável para desconfigurar a culpa do médico. Então, por favor, escreva tudo.
Socialização do risco médico
Andei pesquisando, lendo algumas coisas de pessoas que se dedicam ao Direito Médico e li interessantes artigos. No entanto, não concordo com a maior parte do que li.
É verdade que hoje, vivemos uma era do risco e que a sociedade atual vive um momento de aceitar o risco da evolução tecnológica em que vivemos. Entretanto, vejo a idéia de socializar o risco médico como uma fuga de um problema maior: a falta de educação formal.
Isso mesmo, a falta de educação, bom senso, respeito com o profissional, saber distinguir um erro de um mal resultado. É muito mais fácil dividir a reparação de um dano, sem muita das vezes esse dano ter sido causado por um ato culposo, do que chegar a um posicionamento justo e apenas indenizar os casos culposos.
Essa socialização do risco médico consiste em criar um fundo para quitar as futuras indenizações, o que é, no mínimo, falta de bom senso, senão aceitar que todo mal resultado é um erro médico.
E a criação doutrinária e jurisprudencial da responsabilidade subjetiva? Deixar isso assim de lado é um desrespeito com a jurisprudência nacional e estrangeira. É uma injustiça para aqueles que trabalham com zelo e por um infortúnio não alcançam o objetivo esperado. A verificação da culpa é um avanço social para a obtenção de uma justiça verdadeira e não essa que alguns doutrinadores pretendem: a justiça de reparar um dano pelo simples fato de existir um dano.
Estes doutrinadores defendem essa idéia pelo princípio do equilíbrio social, o qual distribui os danos sofridos por um, perante todos da sociedade (criação de seguros capazes de quitar as indenizações). Essa mutualização dos riscos, para eles, é a melhor maneira de proteção contra qualquer adversidade imerecida.
Cheguei a ler que “não é nada imoral, mesmo ante a ausência de culpa, em obrigar a reparação da coletividade pública causadora do dano por atos de seus agentes”. Aqui vejo uma confusão com a responsabilidade objetiva, que sempre é usada contra o Estado, quando este assume qualquer tipo de atividade. Não quero acreditar que queiram impor a responsabilidade objetiva a todo segmento da sociedade, ou seja, basta configurar o dano e o fato relacionado ao dano que pronto, é o bastante para indenizar.
Se o que todos nós queremos é a justiça em suma ampla abrangência, descartar assim a responsabilidade subjetiva não é a solução. Acredito, também, que a socialização do risco do médico seja uma das saídas, senão a mais importante, mas volto a frisar que essa socialização não se dá pela solidariedade da responsabilidade através da criação de seguros contra erro médico, mas sim através da conscientização da população de que nem todo mal resultado é um erro médico.
Como agir em um caso de erro médico?
Antes de tudo, tenha consciência de que o resultado seja necessariamente um erro médico, se informe sobre o procedimento ou tratamento, consulte alguém com conhecimento bastante para confirmar suas suspeitas.
Após a conclusão de erro médico, junte o maior número de documentos que comprove a ligação do dano com o ato do médico ou hospital. Vá atrás do prontuário, ficha de internação, termo assinado pelo paciente. Pegue, também, receitas médicas, enfim, tudo que você relacionar com o erro médico.
Depois desta pesquisa de documentos vá ao CRM do seu Estado. Lá é o início de qualquer questionamento sobre erro médico. Se você tiver uma resposta favorável, ou seja, se for confirmado erro médico, é a prova inequívoca para sua ação judicial. No entanto, não quer dizer que você tenha que esperar o Processo Administrativo do CRM do seu Estado para propor a ação na justiça. O resultado do CRM você pode juntar posteriormente.
Uma coisa importante, antes de propor uma ação judicial, é ver corretamente contra quem irá propor um ação: se contra o médico ou contra o Hospital. Se o médico for contratado do hospital, é mais prudente a ação ser contra o hospital e não contra seu funcionário, até porque existe a ação de regresso para o hospital reaver seus prejuízos por conta de um procedimento culposo de seu funcionário. Já, se o médico apenas utiliza a estrutura do Hospital e não possui nenhum vínculo empregatício com este, a ação deve ser obrigatoriamente proposta contra o médico.
O interessante de fazer essa distinção é sobre o tipo de responsabilidade. No primeiro caso a responsabilidade será sempre objetiva, ou seja, cabe apenas mostrar o dano e ato que gerou o dano. Já no segundo caso, além de mostrar o dano e o fato que gerou o dano, deve-se provar claramente o nexo de causalidade, ou seja, o elo entre o dano e fato que gerou o dano, pois a responsabilidade do médico é subjetiva de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, e assim tem que provar a culpa.
Jurisprudência - Uma decisão correta do Estado do RJ
Apelação Cível nº 2007.001.67498
Apelantes : JOÃO BATISTA DOS REIS DUARTE e OUTRA
Apelado (1) : HOSPITAL JARDIM AMÁLIA LTDA.
Apelado (2) : GETÚLIO FRANSCISCO DE VASCONCELOS
Relator : Des. Roberto Felinto
__________________________________________________________
No relatório do acórdão em questão consta o seguinte: Trata-se de Recurso de Apelação interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 15ª Vara Cível de Volta Redonda (fls. 277/279) que – nos autos da Ação de Responsabilidade Civil ajuizada por JOÃO BATISTA DOS REIS DUARTE e OUTRA em face do HOSPITAL JARDIM AMÁLIA LTDA. e de GETÚLIO FRANSCISCO DE VASCONCELOS, para condenação pelo fato de a Autora ter sido submetida à uma cirurgia de laqueadura tubária e ter engravidado quatro anos depois – julgou improcedente os pedidos e condenou os autores no pagamento das despesas processuais e honorários de advogado, fixados em R$ 500,00 para cada réu, ressalvado o disposto no artigo 12 da Lei nº 1060/50.
Inconformados, apelam os autores (fls. 283/291), requerendo a reforma da sentença. Para tanto, aduzem, em apertada síntese, que restou demonstrada a conduta culposa dos réus.
O mais interessante, a meu ver, está no voto do Relator. Sucinto, o voto aponta o conhecimento do Marido, ora autor, de que a cirurgia de laqueadura tubária tem 90% de êxito, ou seja, que a paciente, após a cirurgia, tem 90% de chance de não engravidar.
Usando as palavras do Relator: “Ora, 90% de chances significam 10 % de probabilidade, o que, em se tratando de reversão espontânea do organismo com o retorno natural da fecundidade (recanalização) após o procedimento de laqueadura tubária, não caracteriza erro médico”.
Ficou evidente, após a leitura do termo de consentimento assinado pelo Marido da paciente, tomando ciência das possibilidades futuras de fecundação, e o próprio depoimento deste, que o Médico, representando o Hospital, teve todo o zelo de respeitar a lei vigente, informando, de forma continuada, todo o procedimento e suas prováveis conseqüências ao familiar presente da paciente.
O Relator conclui que não fica caracterizado erro médico a gravidez inesperada, mas sim “uma reversão espontânea de seu organismo”.
Está correto o Relator Dr. Desembargador José Felinto, pois como sempre afirmo, nem todo mal resultado é um erro médico.
NEGLIGÊNCIA, do latim "negligentia"
Os casos de negligência geralmente são provocados por mera preguiça ou desinteresse dos médicos, no entanto, podem, também, ser fruto do cansaço e da sobrecarga de trabalho impostas a muitos médicos em hospitais e postos de saúde.
As formas de negligência mais graves que se encontram no CEM - Código de Ética Médica - são a omissão de tratamento e o abandono do paciente. No entanto, essa discussão vai mais além, porque pode o médico, até certo ponto, escolher seus pacientes, pois ele não é obrigado a atender qualquer pessoa indiscriminadamente e isto está formalizado no Código de Ética Médica, no art. 7º, que afirma: “o médico deve exercer a profissão com ampla autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais a quem ele não deseje, salvo na ausência de outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa possa trazer danos irreversíveis ao paciente”.
Entretanto, este direito de escolha não é absoluto, mas sim limitado pelo próprio artigo do Código de Ética em questão e reiterado no art. 58 do próprio diploma legal que veda ao médico deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em caso de urgência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo.
No que se fala de cansaço e excesso de trabalho, que pode acabar gerando um ato ou omissão negligente, a IATROS, na mesma pesquisa que mostrou a preocupação dos médicos em relação ao erro médico, mostrou, também, como causa do erro médico o cansaço. Veja o gráfico abaixo:

Jurisprudência sobre a Teoria da Perda de uma Chance de Cura
O que achei foi um julgamento no STF contra um escritório de advocacia e seus advogados, proposto por um ex-cliente. A ação tinha a intenção de anular o julgamento da ação que tinha como partes a cliente e o Estado do Rio Grande do Sul. No entanto, esta ação rescisória, baseada na Teoria da Perda de uma Chance, não teve êxito.
Não vamos entrar no tipo de ação escolhida pela ex-cliente, pois não vem ao caso, mas sim, vamos nos atentar ao julgado, que a meu ver foi muito feliz.
Nele, o Relator aponta a ementa do julgamento de 1ª instancia da ação: “(...) Ainda, a responsabilidade civil do patrono é subjetiva, sendo necessária a comprovação de culpa ou dolo (art. 14, § 4º e art. 32 do CPDC). A advocacia trata-se de atividade de meios e não de resultados, não podendo o profissional ser responsabilidade pelo insucesso no certame. Comprovação de desvelo dos profissionais contratados no exercício do mandato outorgado. Outrossim, não está o advogado obrigado a recorrer de toda e qualquer decisão lançada no processo”.
Passando para o Direito médico, encontramos uma analogia simples de se fazer, pois como o Advogado, o Médico também realiza uma atividade de meios, não podendo ele ser responsabilizado pelo insucesso de um tratamento, por exemplo.
O STF foi muito feliz ao negar provimento ao Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 932.446 – RS (2007/0167882-9), e espero que continue assim, pois indenizar baseado nesta teoria abriria um precedente muito equivocado tanto para a sociedade médica, quanto para todos os profissionais liberais que prestam serviços.
Temos que ter em mente que esta Teoria surgiu com o condão de indenizar aqueles casos de erros grosseiros, onde a obrigação de resultado se apresenta.
Isso que é pai...
Súmula 279 STF, e eu com isso?
Para quem não sabe a súmula diz que: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário. Essa jurisprudência predominante no STF é da data de 13/12/1963 (põem tempo heim?). E hoje é usada para basear decisões de recursos com o objetivo de apenas reexaminar as provas contidas nas ações de erro médico.
É interessante mostrar que a utilização dessa súmula pode ser a favor do médico, como ocorre no último julgado do STF. Temos a impressão que todos os instrumentos que existem só servem para ser usadas contra o médico. É errado isso, como pode ser usado contra, pode ser usado a favor, sim. E por favor, usem!
No último julgado desta corte (agravo regimental do agravo de instrumento 616.955-4 SP), a turma decidiu por unanimidade que não daria seguimento pelo simples fato da impetrante querer questionar novamente as provas produzidas no processo original. Assim, como já sabemos as provas não podem ser alvos de recursos.
E você com isso? Simples, agora você já sabe que as provas produzidas e discutidas nas esferas inferiores não podem mais ser discutidas nas esferas superiores. Mas cuidado, isso pode ser tanto bom, quanto ruim.
Para quem quiser ler o Acórdão da decisão mais recente favorável ao médico, aperte aqui.
"Perte d'une chance" - Parte 2
1. ERRO MÉDICO E PERDA DE UMA CHANCE - Neri Tadeu Camara Souza - Link do Artigo
2. TEORIA DA CULPA NO ERRO MÉDICO - Neri Tadeu Camara Souza - Link do Artigo
3. PERDA DE UMA CHANCE - Regina Beatriz Tavares da Silva - Link do Artigo
4. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE NA RESPONSABILIDADE CIVIL – Eduardo Abreu Biondi - Link do Artigo
Espero que aproveitem a leitura e que esta teoria não apavore vocês profissionais liberais, pois já pesquisei jurisprudências dos nossos tribunais aplicando essa teoria não somente para o médico, como também para advogados. É um precedente negativo para profissionais liberais prestadores de serviços que têm que lidar com decisões feitas sobre pressão.